quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

ADEUS AO SARGENTO

Ao ano que se vai, desejo boa viagem. Não sentirei sua falta, mas também não te desejo mal, absolutamente. 2009 foi um ano meio inflexível e autoritário. Ofereceu pouco e a um alto custo, como um sargento desses filmes onde o personagem principal sofre num rigoroso treinamento militar. É como se eu tivesse passado esses últimos 12 meses olhando 2009 por seus calcanhares, na altura de sua bota lustrosa, enquanto ele me ordenava o que fazer e me reprimia quando eu não respondia satisfatoriamente. Houve algumas boas horas, claro, e algum descanso e realização. Foram as pausas para o sono, as refeições, as conversas de alojamento e a correspondência com notícias de casa. No resto do tempo, treinamento puxado, horas mal dormidas, gritaria e exercício exaustivo. Não é que 2009 estivesse me preparando para a guerra - ou pelo menos eu espero que não - mas como se o próprio ano fosse uma guerra. Mas, se aqui estou, no ocaso do ano, é porque venci. Não quero me vangloriar, em hipótese alguma. Talvez eu esteja até sendo exagerado e condescendente comigo mesmo. Mas esse 31 de dezembro, para mim pelo menos, tem um sabor inevitável de missão cumprida. E um desejo ansioso pela chegada de 2010 e suas surpresas. A 2009, minha gratidão pela aprendizagem, um adeus sincero e um aperto de mão. Não mais que isso.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

PARA VER E OUVIR: FLORENCE & THE MACHINE ("KISS WITH A FIST")

"GOOD TIMES FOR A CHANGE"


The Smiths - "Please, Please, Please Let Me Get What I Want" (cover do Luxure). Adequado para lembrar do ano que se vai e do outro que já desponta no horizonte.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

UM LIVRO QUE MERECE SER... ROUBADO


Não tenho o menor desejo de encorajar o crime, absolutamente. Mas quem tiver o prazer único de ler "A menina que roubava livros" entenderá o que eu estou dizendo. O bestseller de Markus Zusak conta a história de Liesel Meminger, uma garotinha alemã, esquálida e curiosa, que desenvolve o hábito de roubar livros em plena Alemanha nazista. Uma história delicada, comovente, que parece sussurrada, como um sonho. É um livro que nos faz uma companhia calorosa, porém tímida. Ideal para dias de chuva e é minha leitura de cabeceira neste final de ano. Ao longo do livro, a habilidade narrativa de Zusak nos apresenta personagens e situações como se nós mesmos estivéssemos presentes durante aquele tempo de trevas e histeria. Para tornar tudo ainda mais misterioso e interessante, descobrimos rapidamente que ninguém menos que a Morte é a narradora da história. Por alguma razão, a pequna Liesel marcou a Morte profundamente, de maneira que ela nunca conseguiu esquecê-la. E como a própria contra-capa do livro nos avisa, "quando a Morte decide contar uma história é melhor você parar para ouvir o que ela tem a dizer".

RUAS E AVENIDAS

Mudar de cidade, digo, para inventar uma nova vida, é uma das experiências mais marcantes que alguém pode vivenciar. Ainda mais para "alguém como eu", PHD na arte de criar raízes e apegos. Porque neste processo de (re)descoberta, muito - também em nós - ganha novidade. Aprendemos não somente sobre o novo, mas sobre o que ficou para trás. Na cartografia de novas ruas e avenidas, muito de nossas vidas também se redesenha diante dos olhos, como uma verdade que sempre esteve escancarada mas que, por alguma razão, só fica clara depois que as afastamos dos olhos. Pelo menos é o que sinto, todos os anos, quando volto para a cidade onde nasci para as festas. Observo em silêncio, as ruas e avenidas, da mesma forma que fazia quando criança. Por detrás dos vidros cristalinos, imaginando e construíndo memórias e aventuras ao longo dos antigos trajetos que hoje experimento como turista. Fico recordando, com certa nostalgia, para onde aqueles caminhos me levavam e para que finalidade. Quando eu corria pelas ruas e avenidas desta cidade como se nelas estivessem narradas as histórias não só do meu passado, mas de meu futuro, também. "Morrerei aqui, será?". Mas eis que mudei de cidade. Mudei a vida. Reinventei a vida. Reinventei um lar. E, ainda que vir até aqui seja "voltar para casa", inevitalmente me deparo com a reflexão de que "venho para a minha casa para então voltar para a minha casa". Para as novas ruas e avenidas onde vou desenhando meu presente, novamente imaginando se também estou escrevendo o meu futuro. Percorrendo novos caminhos e registrando para onde eles vão me levando. Não sei. Acho que o retorno é nostálgico, sempre, porque ele escancara no meu rosto que tanto mudou, mesmo que tão pouco pareça ter mudado. É a minha angustiante reflexão sobre a finitude. Algo meio xiita e ortodoxo, rigoroso, de quem "às vezes se pega sem querer aproveitar a festa, pela certeza que ela em breve se acabará". Assim diz minha mãe, em tantos dos seus momentos de sabedoria. Vivo orbitando esses mundos aos quais pertenço intimamente e contraditoriamente desesperado de medo de não pertencer a  nenhum verdadeiramente. Ou então fico simplesmente pensativo demais. É a chuva na janela. É o cheiro de comida caseira. São as fotos, as dezenas de fotos espalhadas que, em sua desconstrução caleidoscópica e nada cronológica da minha história, narram inequivocamente a finitude que tão inocentemente insisto em combater. Ruas e avenidas. Quando o céu nublado se desfaz milagrosamente em raios amarelos e o calor do sol volta a ter sabor de baunilha, relembro que estou feliz, em casa. Enquanto não volto para casa para a companhia de minhas novas ruas e avenidas.

sábado, 19 de dezembro de 2009

O JARDIM JAPONÊS



Angela acordou com uma sensação imperativa de limpeza. Precisava limpar tudo, livrar-se de toda a sujeira que conseguia enxergar pelas paredes, móveis, tapetes e quadros. Tudo parecia revestido de limo, poeira e terra. Algo, uma força maior do que ela mesma, a impelia por todos os cômodos daquela casa antiga. Sentia-se em dívida com aquela herança. Deveria zelar pela imensa casa da colina, notória pelos bailes de outras épocas e fantasmas de dias mais recentes.

Os nativos não arriscavam sequer cruzar a vereda que cortava o grande portão de ferro. Era um caminho prático, que conduzia à pequena cidade com extrema rapidez. Não, nem crianças, nem velhos, nem moças, ninguém se autorizava a cortar caminho por ali. Evitavam a casa como quem evitava o diabo. Preferiam descer pelas montanhas, era mais seguro. Havia algo ali, para dentro dos portões caídos e enferrujados. Algo velho, muito velho, que sussurrava por entre a grama alta e o barulho das tábuas que se retorciam como se conversassem umas com as outras. Havia algo ali. Algo sinistro, que fazia as mais velhas arregalarem os olhos e mastigarem cada palavra ao dizerem que “aquela era uma casa de mortos”.

Mas aquela casa era tudo que restava à Angela. Seu marido a havia abandonado. E seus filhos, já deixando a universidade, haviam esquecido dela há anos. Tudo o que sobrou era a casa de seu velho tio, meio-irmão de sua mãe, um famoso fazendeiro de tabaco que havia perdido tudo em dívidas, jogos e mulheres. Alguns ainda a disseram que tudo foi destruído pelo seu atrevimento insistente em “mexer com forças que não deviam ser incomodadas”.

Naquela manhã, no entanto, era como se um exército de sombras e vozes e ventos a arrastassem por toda a propriedade. Sentia-se sem pés, flutuando a um palmo do chão. Observava as árvores mortas, um balanço preso por apenas por uma corda, um velho poço, fontes dágua com anjos desfigurados pelo tempo e restos de móveis do que um dia foi um jardim.

Então se viu parada diante de um gigantesco relógio de parede. Desperta do transe, sentiu um ímpeto violento de derrubá-lo no chão. O barulho ensurdecedor fez os cachorros latirem ao longe. Mas isso pouco importou à Angela que, caminhando descalça sobre restos de vidro, ponteiros e engrenagens ainda agonizantes, deparou-se com um túnel escuro, aberto grosseiramente na parede, mas perfeitamente escondido atrás do relógio, quando ainda inteiro.

Sem pensar duas vezes, abaixou-se e, no limiar de engatinhar, enveredou-se pelo buraco escuro, como uma fenda no tempo. Não conseguia, sequer, enxergar suas mãos. Rastejava. Sentia os joelhos sujos e as mãos úmidas, enquanto prosseguia. E não enxergava absolutamente nada. Nem ouvia nada. Era como se estivesse só, completamente só, num espaço sem donos, sem regras, sem física. Apenas tinha o desejo de continuar. Aos poucos, começava a sentir pequenas pedras por entre seus dedos, e um sopro de vento ameaçava tocar o seu rosto. Até que começou a enxergar um ponto de luz, quase se perdendo no infinito. Foi quando teve a certeza de continuar.

Num determinado momento, sentiu que o seu túnel ficava cada vez mais estreito, apertando seu corpo contra as paredes molhadas, que já a sufocavam. Mas nem por isso deixou de continuar. Seu queixo começava a roçar no chão, quando pôde enfim avistar uma pequenina janela. Havia chegado ao seu ponto de luz. Forçou com o punho fechado a pequena abertura por onde mal passaria uma criança pequena. E arrebentou as dobradiças com a sua determinação.

Espremeu-se como uma enguia e, com angustiosa dor, conseguiu se projetar para fora daquele ventre de barro e pedra. E assustou-se com o silêncio que a circundava. Estava de pé, num jardim japonês, branco, estranhamente sem cor alguma e em silêncio abissal. Grama branca, pedras brancas, lanternas brancas, cerejeiras brancas, céu branco, sol branco. Seu corpo estava branco, e seu cabelo, vestido, unhas e pés e mãos. Tocou-se como quem toca uma miragem e percebeu que tudo aquilo era real. Brutalmente real.

Angela olhou para trás, procurando o seu caminho de retorno. Mas ele havia se fechado, como uma ferida cicatrizada, que deixa evidente a silhueta de corte recente. E desmaiou, sentindo vividamente cada centímetro do seu corpo batendo contra o chão branco, sem cheiro nem temperatura. A fina areia a envolveu e ela pôde sentir mãos delicadas correndo pelo seu cabelo, pescoço, rosto. Não quis mais abrir os olhos. Deixou-se afundar, lentamente, sucumbindo como uma pedra que corta a água do mar no seu trajeto para o fundo. E sentiu-se em paz.

* * *

“Esta noite tive o sonho mais estranho de minha vida”, disse Angela ao seu marido que, fechando a porta de casa, sequer olhou em sua direção. “Tenha um bom dia, Angela”, disse apenas, “não me espere para o jantar”.

Conformou-se, como sempre. Limpou a mesa das migalhas de pão e lavou toda a louça. Sobre a cômoda, ainda estavam as correspondências não abertas, desde o dia anterior. Para ela, apenas um envelope, de um escritório de advogados associados.

BLAKE, NORTHWEST & FUKUGAWA – ADVOGADOS ASSOCIADOS

* * *

Não havia quem não apreciasse a misteriosa arte de Eiko Yamasaki. Suas gravuras estampavam camisetas, postais e inspiravam diretores de cinema e estrelas pop. Seus motivos eram sempre os mesmos: mulheres desesperadamente sós, caminhando por jardins sem cor, povoados de sombras e fantasmas. Quando questionada sobre suas inspirações, tinha sempre pronta a resposta:

“Estas mulheres estão vivas. E habitam os meus sonhos, todas as noites”.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

"ODE AO GATO" (PABLO NERUDA)



Os animais foram
imperfeitos,
compridos de rabo, tristes
de cabeça.
Pouco a pouco se foram
compondo,
fazendo-se paisagem,
adquirindo pintas, graça, voo.
O gato,
só o gato
apareceu completo
e orgulhoso:
nasceu completamente terminado,
anda sozinho e sabe o que quer.

O homem quer ser peixe e pássaro,
a serpente quisera ter asas,
o cachorro é um leão desorientado,
o engenheiro quer ser poeta,
a mosca estuda para andorinha,
o poeta trata de imitar a mosca,
mas o gato
quer ser só gato
e todo gato é gato
do bigode ao rabo,
do pressentimento ao rato vivo,
da noite até seus olhos de ouro.

Não há unidade
como ele,
não tem
a lua nem a flor
tal contextura:
é uma só coisa
como o sol ou o topázio,
e a elástica linha em seu contorno
firme e sutil é como
a linha da proa de um navio.
Seus olhos amarelos
deixaram uma só
ranhura
para jogar as moedas da noite.

Oh, pequeno
imperador sem orbe,
conquistador sem pátria,
 tigre mínimo de salão, nupcial
sultão do céu
das telhas eróticas,
o vento do amor
na intempérie
reclamas
quando passas
e pousas
quatro pés delicados
no solo,
cheirando,
desconfiando
de todo o terrestre,
porque tudo
é imundo
para o imaculado pé do gato.

Oh, fera independente
da casa, arrogante
vestígio da noite,
preguiçoso, ginástico
e alheio,
profundíssimo gato,
polícia secreta
dos quartos,
insígnia
de um
desaparecido veludo,
seguramente não há
enigma
na tua maneira,
talvez não sejas mistério,
todo o mundo sabe de ti e pertences
ao habitante menos misterioso,
talvez todos o acreditem,
todos se acreditem donos,
proprietários, tios
de gatos, companheiros,
colegas,
discípulos ou amigos
do seu gato.

Eu não.
Eu não subscrevo.
Eu não conheço ao gato.
Tudo sei, a vida e seu arquipélago,
o mar e a cidade incalculável,
a botânica,
o gineceu com seus extravios,
o por e o menos da matemática,
os funis vulcânicos do mundo,

a casaca irreal do crocodilo,
a bondade ignorada do bombeiro,
o atavismo azul do sacerdote,
mas não posso decifrar um gato.
Minha razão resvalou na sua indiferença,
o seu olho tem números de puro.

PARA VER E OUVIR: CAETANO VELOSO CANTA "PALOMA" EM "FALE COM ELA", DE ALMODÓVAR


Linda homenagem de Almodóvar, ao transformar Caetano Veloso em um sonho num de seus filmes mais especiais. "Fale com ela" é, inteiro, um sonho.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

COISA DE SONHO



Vitrine da Maison Hermès, em Tóquio. Design de Tokujin Yoshioka. Modelos virtuais "sopram" de verdade os lenços delicados em exposição. Um deleite para os olhos, um absurdo de minimalismo. Extremamente silencioso e japonês. Coisa de sonho.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

NIKOLAI E O SONHO


Dificilmente Nikolai se afastava da janela. Era sua morada, seu refúgio. Era o espaço onde passava dias e noites, noites e dias, com breves interrupções para os outros afazeres de sua vida. Nikolai era conhecido por sua discrição. Movimentos curtos e precisos, caminhar comedido, silencioso e elegante, mas carinhoso e dedicado com seu principal protetor: um senhor de 89 anos, famoso professor de música, já nos últimos suspiros da sua passagem pela terra.

Nikolai foi praticamente adotado por ele, num desses acasos do destino em que duas almas se esbarram por alguma razão qualquer e decidem continuar juntas. Nikolai e seu protetor eram companheiros fiéis numa vida de muitos silêncios. Nos dias ensolarados, o velho gostava de caminhar até a esquina, onde comprava peixe e pão frescos. Almoçavam juntos, salmão e pão preto, no terraço do velho apartamento em Paris.

Em dias chuvosos, gostavam de contemplar juntos a janela molhada e a cidade cinza no horizonte restrito daquele recorte de meio metro quadrado que emoldurava uma Paris lindamente iluminada e colorida. Nesses momentos, o velho bebericava conhaque e balbuciava algumas lembranças desconexas de um passado já há muito perdido na poeria do tempo. Um passado de recitais e alunos medíocres, de festas e moças mais ávidas por casamentos de contos de fadas do que pelo saber musical. Nikolai não se manifestava e preferia observá-lo atento, ocasionalmente se distraindo por algum passarinho na janela ou um bocejo incontrolável. Nada que incomodasse o velho, no entanto.

E assim eram os últimos dias daqueles dois amigos inseparáveis. Até que, enfim, o velho professor não se levantou mais de sua cama solitária. Havia partido. Nikolai entrou vagarosamente no quarto, passo ante passo, e contemplou o corpo frio sobre o catre daquele quarto sem luxo, incrédulo à sua maneira e demonstrando supresa e melancolia. Sentou-se por alguns instantes e olhou para o teto como se conseguisse visualizar seres flutuantes. E resignou-se com a ideia de que seu protetor o havia deixado, caminhando lentamente até o antigo piano que decorava a sala como uma ilha de mogno vermelho num oceano de cinzas.

Lá, deitou elegantemente sobre o teclado frio que abraçou seu corpo pequenino como uma almofada de marfim e ébano. Fechando os olhos vagarosamente, pareceu-lhe estar ingressando em mais num daqueles sonhos enigmáticos que tinha quase todas as noites. Seus sonhos de gato. Sonhos em que não era um gato, mas um garotinho solitário.

* * *

Um solavanco repentino retirou Nikolai de seu sono profundo como um susto. O trem acabava de chegar à estação, consumindo tudo ao seu redor em fumaça e barulho. Era uma manhã muito fria quando Nikolai chegou com sua mãe à Paris, em 1948.

"Veja, Nikolai, que linda cidade. Seremos felizes aqui, meu filho, estou certa de que seremos felizes aqui".

Nikolai olhou para sua mãe, que sorria, maravilhada com os ares de Paris. Filho de um paraquedista morto na guerra, Nikolai chegava à cidade e enfim conheceria o seu avô, que não via desde o seu nascimento. Com a luz que lentamente começava a despontar, colorindo as ruas preto-e-branco, Paris se descortinava diante de seus olhos iluminados e ávidos pelas novidades. Nikolai aprenderia a tocar piano com o seu avô. Era esse o plano. E rapidamente o menino esqueceu de seu sonho. Mais um sonho enigmático em que era, não um garotinho, mas um gato de pelo listrado e olhar silencioso.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

PARA VER E OUVIR: SARAH MCLACHLAN ("ADIA")

PARA VER E OUVIR: SARAH MCLACHLAN ("I WILL REMEMBER YOU")


Hino oficial da saudade e da nostalgia. O filme no clipe é "Os irmãos Mcmullen".

sábado, 5 de dezembro de 2009

EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO. SEMPRE.


V

T.S. ELIOT

So here I am, in the middle way, having had twenty years—
Twenty years largely wasted, the years of l'entre deux guerres
Trying to use words, and every attempt
Is a wholly new start, and a different kind of failure
Because one has only learnt to get the better of words
For the thing one no longer has to say, or the way in which
One is no longer disposed to say it. And so each venture
Is a new beginning, a raid on the inarticulate
With shabby equipment always deteriorating
In the general mess of imprecision of feeling,
Undisciplined squads of emotion. And what there is to conquer
By strength and submission, has already been discovered
Once or twice, or several times, by men whom one cannot hope
To emulate—but there is no competition—
There is only the fight to recover what has been lost
And found and lost again and again: and now, under conditions
That seem unpropitious. But perhaps neither gain nor loss.
For us, there is only the trying. The rest is not our business.

Home is where one starts from. As we grow older
The world becomes stranger, the pattern more complicated
Of dead and living. Not the intense moment
Isolated, with no before and after,
But a lifetime burning in every moment
And not the lifetime of one man only
But of old stones that cannot be deciphered.
There is a time for the evening under starlight,
A time for the evening under lamplight
(The evening with the photograph album).
Love is most nearly itself
When here and now cease to matter.
Old men ought to be explorers
Here or there does not matter
We must be still and still moving
Into another intensity
For a further union, a deeper communion
Through the dark cold and the empty desolation,
The wave cry, the wind cry, the vast waters
Of the petrel and the porpoise. In my end is my beginning.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

CONTEMPLADORES DE JANELAS


Uma pesquisa decidiu investigar o que gatos domésticos fazem quando estão sozinhos em casa. Para isso, câmeras escondidas tiraram fotos a cada 15 minutos, registrando o que os gatos faziam de seu tempo enquanto os donos não estavam por perto. Quase 800 fotos foram estudadas e se descobriu que, na maior parte do tempo, os gatos domésticos dedicam seus dias a olhar pelas janelas. O restante, dedicam a dormir, esconder-se e brincar. Contempladores de janelas. Amo-os ainda mais hoje.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

O GATINHO MAIS LINDO DO MUNDO


Não dá para resistir... é terapêutico.

O TEMPO & EU

Eu e o tempo. O tempo e eu. Relação de amor e ódio que, neste final de ano, comemora três décadas. O tempo passa, realmente, diante dos nossos olhos e de forma praticamente imperceptível. Faço jogos comigo mesmo, sem grande fundamento, que acredito poderem me ajudar a mensurar sua passagem silenciosa e devastadora, ainda que rica e repleta de memórias, lembranças, aprendizado e satisfação. Gosto de me olhar no espelho, ocasionalmente, e tentar enxergar o "eu" de 5 anos atrás. De 10 anos atrás. 15, 20. E é como se eu conseguisse, porque fica a ilusão de que "não mudei tanto assim", que "estou mais ou menos da mesma forma". E aí surgem os clichês, de que alguns fios de cabelo branco e um punhado de rugas discretas não deixam mentir. Mas é como se eu não as enxergasse e acreditasse, de fato, que não mudou muita coisa. Sou o mesmo, quase igual, apenas com anos a mais. E a ilusão até dura, surpreendentemente. Mas é inevitável constatar que tanto muda, que tanto mudou. Muitas vezes para melhor, outras para pior, mas sempre é um conjunto de ideias sobre uma vida que já ficou para trás. E isso é extremamente doloroso. Ainda que nada se perca, já que tudo o que "fica" é convertido em memória. Comos os discos que gravamos em fita, que gravamos em cd, que gravamos em dvd, que gravamos em bluray... Mas o original ficou para trás e tenho certeza que, na conversão contínua de acontecimentos reais em lembranças bluray, muito se perde. Caminhamos para frente, em marcha firme, sem a opção de retroceder. No máximo, olhar para trás. Dezembro é emblemático para mim, por razões óbvias. É o mês do desfecho, do balanço, de começar a contabilizar o ano. 2009, definitivamente, não foi um ano bom. Ele teve "seus momentos". O ano foi uma maratona, com breves e fugazes momentos de descanso. Sinto que andei quase todo o tempo na reserva, sem muita chance para abastecer, para carregar as baterias apropriadamente. Foi um ano em que senti na pele, como corte, a sensação do amadurecimento. Como se tivesse deixado parte de um "eu mais jovem" na estação. Como se eu tivesse dado adeus definitivo a algo de mim que já não poderia mais me acompanhar na jornada; provavelmente porque em breve - ou quem sabe neste exato momento - já esteja em companhia de um novo eu - ou parte dele - com quem seguirei a partir de agora. Catarse, devaneio, filosofia sem muito fundamento. É algo que vem e volta, geralmente nessa época do ano em que carimbamos "mais um". Fazia tempo que não sentava na ilustre companhia de meus botões, na minha solitária contemplação de janelas, enquanto observo o silêncio da rua, os carros que passam, os apartamentos acesos de maneira aleatória como um sorriso largo onde faltam alguns dentes. Talvez porque eu acabe sentindo tanta falta de mim mesmo - ou de algum eu que se foi e não voltará mais - acabo evitando socializar comigo mesmo para não constatar a inevitável passagem do tempo. Porque sinto saudade. São meus jogos sem grande resultado. Não dá para enganá-lo, não tem jeito. E acabo dançando conforme sua música e obedeço, como servo infiel, este meu mestre rigoroso. E, passada a estranheza de todos os finais de ano, continuamos a seguir juntos. O tempo e eu.

PARA VER E OUVIR: PATO FU ("SOBRE O TEMPO")