quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

RUAS E AVENIDAS

Mudar de cidade, digo, para inventar uma nova vida, é uma das experiências mais marcantes que alguém pode vivenciar. Ainda mais para "alguém como eu", PHD na arte de criar raízes e apegos. Porque neste processo de (re)descoberta, muito - também em nós - ganha novidade. Aprendemos não somente sobre o novo, mas sobre o que ficou para trás. Na cartografia de novas ruas e avenidas, muito de nossas vidas também se redesenha diante dos olhos, como uma verdade que sempre esteve escancarada mas que, por alguma razão, só fica clara depois que as afastamos dos olhos. Pelo menos é o que sinto, todos os anos, quando volto para a cidade onde nasci para as festas. Observo em silêncio, as ruas e avenidas, da mesma forma que fazia quando criança. Por detrás dos vidros cristalinos, imaginando e construíndo memórias e aventuras ao longo dos antigos trajetos que hoje experimento como turista. Fico recordando, com certa nostalgia, para onde aqueles caminhos me levavam e para que finalidade. Quando eu corria pelas ruas e avenidas desta cidade como se nelas estivessem narradas as histórias não só do meu passado, mas de meu futuro, também. "Morrerei aqui, será?". Mas eis que mudei de cidade. Mudei a vida. Reinventei a vida. Reinventei um lar. E, ainda que vir até aqui seja "voltar para casa", inevitalmente me deparo com a reflexão de que "venho para a minha casa para então voltar para a minha casa". Para as novas ruas e avenidas onde vou desenhando meu presente, novamente imaginando se também estou escrevendo o meu futuro. Percorrendo novos caminhos e registrando para onde eles vão me levando. Não sei. Acho que o retorno é nostálgico, sempre, porque ele escancara no meu rosto que tanto mudou, mesmo que tão pouco pareça ter mudado. É a minha angustiante reflexão sobre a finitude. Algo meio xiita e ortodoxo, rigoroso, de quem "às vezes se pega sem querer aproveitar a festa, pela certeza que ela em breve se acabará". Assim diz minha mãe, em tantos dos seus momentos de sabedoria. Vivo orbitando esses mundos aos quais pertenço intimamente e contraditoriamente desesperado de medo de não pertencer a  nenhum verdadeiramente. Ou então fico simplesmente pensativo demais. É a chuva na janela. É o cheiro de comida caseira. São as fotos, as dezenas de fotos espalhadas que, em sua desconstrução caleidoscópica e nada cronológica da minha história, narram inequivocamente a finitude que tão inocentemente insisto em combater. Ruas e avenidas. Quando o céu nublado se desfaz milagrosamente em raios amarelos e o calor do sol volta a ter sabor de baunilha, relembro que estou feliz, em casa. Enquanto não volto para casa para a companhia de minhas novas ruas e avenidas.

2 comentários:

lilian disse...

FUI EM CASA VER MINHA FAMILIA,EM CAMPINAS,E AO CHEGAR EM S.P. DE VOLTA,ENCONTRO ESTE DEVANEIO,QUE ME ESPELHA..ME DIVIDE..E ME INTEIRA.
FELIZ 2010.

Anônimo disse...

obrigada...