domingo, 25 de dezembro de 2011

A PRISÃO SEM MUROS

Por onde começar, para pelo menos TENTAR falar sobre esse filme? "A Pele que Habito" (La Piel que Habito) não é apenas o melhor filme de Almodóvar; é um dos melhores filmes que já vi em toda a minha vida. Uma história eletrizante, que deixa os olhos secos pela impossibilidade de piscá-los enquanto a trama se desenrola na tela. 

Mas como discutir esse filme sem confidenciar seus segredos? Como dizer do atropelamento mental que é essa história arrebatadora, sem revelar a caixa de mistérios que Almodóvar esconde com uma maestria que chega a comover? A genialidade deste filme dá vontade de chorar; o que é contraditório diante da tragédia inexplicável que se constrói diante dos nossos olhos incrédulos. 

Há uma beleza sem nome e um absurdo nomeado neste filme que só posso conceber como um mórbido conto de fadas às avessas. Passado nos dias de hoje em Toledo, Espanha, vamos pouco a pouco descobrindo a infeliz vida do Dr. Roberto (Antonio Banderas) que vive numa villa onde mantém prisioneira Vera (Elena Anaya). Ela habita um cômodo onde vive com conforto, com livros, exercícios e uma câmera de onde é monitorada 24 horas por dia, inclusive a partir de uma tela gigantesca no quarto de Roberto, onde muitas vezes Vera parece ser um quadro emoldurado.

Vera é prisioneira do Dr. Roberto, que a mantém praticamente emoldurada, como um fetiche voyerista

Mas por qual razão Vera é mantida presa? O que pretende o Dr. Roberto? Entendemos que ele está à frente de uma grande descoberta científica, uma pele modificada geneticamente e que é mais resistente do que a pele humana. Sua tragédia pessoal parece tê-lo motivado, já que Roberto perdeu sua mulher num incêndio.

Assim, vamos testemunhando o cativeiro de Vera que, aparentemente, parece estar se recuperando de algum tratamento. Em paralelo, pedaços e fragmentos de uma vida de tristezas, marcada por uma série de pessoas infelizes e decisões trágicas. 
O que é Vera? Um fetiche? Um brinquedo? Um desejo impossível de se reaver algo?

Mas há um propósito, uma finalidade, uma explicação que vamos lentamente decifrando até o confronto final que Almodóvar nos expõe. Com genialidade absoluta, o diretor vai nos conduzindo por um caminho de certezas e deduções até virar nosso mundo de ponta cabeça, similarmente ao que vemos na tela. 

Infelizmente, há pouco a se dizer sobre esse filme magistral, essa obra de arte inquestionável, sem revelar seus maiores tesouros que são justamente as descobertas que fazemos - e que devemos fazer sozinhos.

Um filme que me deixou em silêncio profundo, sepulcral, cativo de minhas próprias ideias. Um filme como poucos, um filme como não se faz ultimamente. Uma história brilhante, perturbadora, perfeita, ainda que beirando o limite da dor e da tragédia humana. Um filme importante além do importante.

Uma história sobre uma prisão sem muros, uma experiência a ser vivida.

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