quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

MOÇA DE OLHOS LILASES

Havia algo especial a respeito dela. Não que isso fizesse alguma diferença - de fato não fazia, porque naquele momento tudo a respeito dela parecia especial.

Ele gostava da maneira como ela cruzava as pernas, um quê de impaciência e desleixada elegância; um ar meio francês a respeito de como as suas mãos pousavam sobre os joelhos. Joelhos pequeninos, que se projetavam com delicadeza da barra da saia de forro vermelho que se derramava pela cadeira. 

Ele gostava do desenho que os ossos do colo faziam sob o tecido delicado da sua blusa. Um tom azulado que combinava com o caimento do seu cabelo. Aquela vastidão de fios ondulados, quase desgranhados, em ouro velho. Aquela moldura adequada para o seu rosto de gato, equilibrado sobre um pescoço esguio, de marquesa. De amante.

Ela conversava com algumas pessoas assuntos de pequena importância. Ocasionalmente rindo, sorrindo, dominando o assunto, epicentro de todas as questões. Havia uma energia ao seu redor que parecia guiar os olhares, dentro e fora da sua mesa. Ela chamava atenção com a competência das pessoas que não desejam ser notadas.

Qual seria o seu nome? Ele começou a fazer este jogo solitário, embaralhando uma centena de possibilidades em sua mente. Queria saber mais sobre aquela mulher. Seus destinos, seus gostos.

Queria que ela olhasse de volta.

Não que ela fosse perfeita. Não era. Ela não era a mulher mais linda do mundo, definitivamente não; tampouco tinha o corpo perfeito. Aliás, curvas leves sob a roupa denunciavam que ela era destas mulheres que se libertaram; que descobriram que ou se é magro ou se é feliz.

Mas ela tinha um olhar sincero, um sorriso iluminado e uma voz adocicada que faziam um convite irrecusável. E o fato de ela não ter ideia que ele a observava deixava aquilo perfeito, meio platônico, meio secreto.

Aquele delicioso desencontro urbano.

Havia algo a respeito de como ela tocava o seu rosto. Uma delicadeza meio mágica conduzida pelas pontas dos seus dedos. Ou como mexia no cabelo, sempre que ele lhe cobria um dos olhos. Aqueles olhos lilases. Era difícil decifrar o que habitava aquelas duas moedas pequeninas, janelas de um país secreto. Somente dela, guardado.

E então ela se levanta, as mãos ocupadas com o celular. Aquelas respostas inadiáveis, como todas as respostas de celular. As pernas bonitas, encaixadas sobre sapatos elegantes. Passos decididos de quem tem plena certeza de onde se está indo. Uma bolsa pequena sob um dos braços enquanto o outro enroscava-se num felizardo sem nome.

Qual seria o cheiro da sua pele? Ou o toque dos seus lábios? Que marcas estariam escondidas sob a roupa? Que caminhos? Que histórias? Aquelas perguntas sem resposta.

E então ela foi embora, sem jamais saber que - pela agridoce eternidade daqueles momentos fugazes - sequestrou os pensamentos honestos de um observador acidental.

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