terça-feira, 24 de setembro de 2013

PARA VER E OUVIR: NANA CAYMMI ("NÃO SE ESQUEÇA DE MIM")


Essa poesia  carregada no sangue, no DNA, só pode ser. O que é a voz desta mulher?

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

sábado, 21 de setembro de 2013

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

PARA VER E OUVIR: AZEALIA BANKS ("212 FT LAZY JAY")

OS REIS DO VERÃO

Cansado de um pai opressor e autoritário, Joe decide ir embora de casa. Não é apenas que ele decide "fugir" pura e simplesmente; ele vai para o mato, onde tem uma epifania: construir uma casa e lá, como um selvagem, reinar. 

Essa é a história do surpreendente "The Kings of Summer", filme de Jordan Vogt-Roberts e estrelado por Nick Offerman (o eterno Ron Swanson de "Parks & Recreation") e pelo talentoso Nick Robinson, no papel principal, o profundo menino Joe que, com apenas 15 anos, decide questionar todas as certezas da vida num plano determinado em inventar a sua própria (vale ficar de olho neste menino, que lembra um jovem Ryan Gosling).

Joe reúne dois amigos em sua empreitada. Patrick, seu melhor amigo - e responsável pelo ponto de crise na trama - e Biaggio, a fuga cômica da história. Juntos, os três desbravam a vida no mato onde, pouco a pouco (e ocasionalmente de forma artificial) se desprendem dos confortos da vida moderna até o momento em que é preciso separar quem realmente está levando aquilo a sério e quem encara tudo como uma brincadeira.

Patrick, Biaggio e Joe. Meninos "alérgicos aos pais" que desejam ser homens

A beleza deste filme habita não no seu roteiro que, em si, não oferece nada de surpreendente; mas nas pequenas coisas, nas entrelinhas, nos não ditos. "The Kings of Summer" é um filme sobre a inocência - e a sua eventual perda; é um filme sobre aquelas lembranças inesquecíveis, de um tempo perfeito que só nos damos conta do seu valor quando acaba, quando passa. 

É sobre a beleza de se ter 15 anos e acharmos que sabemos de tudo, que já compreendemos tudo. É sobre o sabor da liberdade que mora em nossos sonhos inocentes e que, quanto mais envelhecemos, mais a deixamos escapar entre os dedos. Até o ponto em que já quase não é possível enxergá-la.

"The Kings of Summer" é um filme belo, marcado por uma trilha sonora indie e uma fotografia muito poética que muito me lembraram os filmes de Wes Anderson. Um filme pequeno, com cheiro de nostalgia, e que muito me tocou a alma.

SÓ MAIS 5 MINUTOS...


Como "só mais cinco minutinhos" podem fazer toda a diferença. Lindo, lindo curta de animação que eu jamais teria descoberto não fosse o Chongas.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A FLOR NO CONCRETO

"Eu acho que nunca aprendi a ser feliz", ela dizia, quase sussurrando, da sua janela insone. Os olhos úmidos, escondidos sob as mãos cheias de dedos finos e compridos. As unhas roídas, os pulsos finos. Os braços decorados por uma penugem que refletia a luz que invadia o quarto bagunçado.

E ele ficava ali, em silêncio, entre os lençóis desfeitos, observando a sua mulher. Disfarçando a sua própria tristeza. Ela era linda e frágil como uma flor de porcelana. A pele delicada, fina e branca como papel, os cabelos dourados despencando pelos ombros nus, as linhas daquele corpo magro de quem se alimentava tão mal. A voz rouca, sussurrada, e aquela dificuldade em concatenar os pensamentos, entrecortados pelo abdômen que parecia engasgá-la em angústia. Aquela alma triste, sua bailarina. 

Era era tão linda. Deus, ela era tão linda. E tão frágil.

Eles tentaram inventar uma vida naquele apartamento minúsculo, encravado no barulhento bairro boêmio, onde sustentavam aquelas certezas falhas de quem ainda está longe de completar 30 anos. Precisavam de tão pouco, pensavam, enquanto riam os seus sorrisos de vinho. Aqueles sorrisos raros.

Ela tentava, também. A dança que deixava aqueles pés imundos cheios de feridas. A música que a deixava em transe, quando ela não se importava em escorregar todas as lágrimas represadas. Ela tentava.

Havia também o crochê, os livros por terminar, a bulimia, a cocaína. Aquela alma fragmentada, em pedaços, desde o primeiro dia em que seus olhos pararam nela. Ele sabia, ele admitia - e lembrar de tudo aquilo era como um soco em seu estômago; as fotos espalhadas pela cama, os abraços, os sorrisos, perdidos no tempo. Ela era tão infeliz. Mas ela era feliz com ele, ele sabia. De alguma forma ela era.

"É como diz a canção", ela dizia, enquanto eles viam o sol nascer na janela. "O amor é o que nos destrói". E ele fingia concordar, abraçando o seu corpo pequenino contra o seu, beijando a sua testa, fazendo carinhos em suas costas, escondendo o seu choro. Aquele desejo desesperado, impotente, de curá-la.

De consertá-la. 

"Vamos ver os fogos de artifício", ela disse um dia, puxando-o pela mão. Subiram como crianças as escadas de ferro para o topo do prédio, os olhos arregalados diante do brilho que tomava o céu daquela noite qualquer. A vida era boa, naqueles minutos fugazes a vida era boa.

Abraçaram-se, por tanto tempo, como se tivessem desaprendido a descolar os corpos. Ela olhou nos seus olhos, fazendo carinhos em seu rosto. Um beijo úmido, um suspiro.

A verdade é que ele nunca entenderia ao certo a cadeia de eventos que unia aquelas lembranças. Mesmo após tanto tempo. Aquele ilusionismo terrível, onde o mundo vira de ponta cabeça com um piscar de olhos. Primeiro está ali; depois não está.

Ele lembrava de tê-la em seus braços, do aroma do seu hálito, do toque dos seus dedos em seu rosto e de ela mencionar a sua barba por fazer. Ele lembrava do seu casaco vermelho e da cintura entre as suas mãos. Ele lembrava, aqueles pensamentos rasgados, aquelas imagens órfãs, que vinham sufocar a sua garganta.

Ela era tão linda. Deus, ela era tão linda.

Ela só não sabia voar.                               

sábado, 7 de setembro de 2013

OS LADRÕES VESTEM PRADA

Chanel, Loubutin, adrenalina, tédio, cocaína. Não vou dizer que "The Bling Ring" é o melhor filme de Sofia Coppola. Não é; longe disso, em verdade. Aliás, não fossem algumas cenas emblemáticas (a típica cena de janela de carro), ou a trilha sonora excelente, talvez eu nem pudesse identificar. Quero dizer com isso que o filme é ruim? Longe, longe disso também.

Sofia está em casa aqui, quase literalmente. Tendo o universo da moda e do consumo como pano de fundo e unindo o realismo de "Somewhere" à extravagância de "Marie Antoinette", "The Bling Ring" (baseado em fatos reais) é uma mistura de drama e documentário sobre uma história real do passado recente dos Estados Unidos: um grupo de adolescentes ricos e entediados que decidem roubar as casas de celebridades. 

A trama é simples. Amigos de escola se unem e, ao compartilharem o tédio e a falta de perspectiva em suas vidas marcadas pela futilidade, cocaína e fotos postadas em redes sociais, decidem provar que são invencíveis ao invadir as mansões de celebridades como Paris Hilton e Lindsay Lohan. No caminho, inúmeras conquistas recheadas de sapatos, bolsas, jóias e relógios de marca. O que poderia dar errado?

O filme é narrado em flashback, com a gangue relatando a cadeia de eventos que os leveram à criminalidade. Todos inocentes, todos iludidos, todos trazidos ao crime por "más companhias". Mas não entendam errado. Sofia Coppola não pretende, em hipótese alguma, fazer um filme sobre moralidades aqui. Bem ao contrário. Por um lado, ela se delicia ao expôr uma orgia consumista permeada por uma trilha sonora animada quase inteiramente por hip-hop. Por outro, pretende escancarar o vazio da cultura atual nos Estados Unidos onde só há vida onde há notoriedade. 

Eles são jovens, bonitos e ricos. E decidem brincar com fogo, descobrido mais cedo ou mais tarde que o crime pode ser delicioso, mas nunca compensa

As meninas querem as bolsas, os vestidos e os sapatos caríssimos? Sim, claro, óbvio que querem. Mas não é apenas o objeto de desejo. É a adrenalina, a exposição, a celebridade dentro da celebridade, definida por uma frase genial quando uma das criminosas é interrogada: "O que Lindsay disse sobre mim?", ela pergunta ao policial quando este indaga sobre as invasões. É uma crítica velada, escondida sobre as cores e o brilho das marcas e do luxo, uma autópsia chique do estado atual de coisas. 

"The Bling Ring" é, possivelmente, o menor filme de Sofia Coppola. O menos poético, o menos marcante. Mas não menos importante. Ela está aqui, inegavelmente, em cada frame, cada plano, cada câmera lenta, cada reflexão juvenil, de quem não faz ideia do que fazer com a própria vida.

Como se Maria Antonieta estivesse num lugar qualquer, suicida, e simplesmente, perdida na tradução.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

terça-feira, 3 de setembro de 2013

ILUSTRANDO

August Macke - "Mulher de jaqueta verde"

PARA VER E OUVIR: JOHN MAYER FT FRANK OCEAN ("WILDFIRE")

domingo, 1 de setembro de 2013

DEZEMBRO

Após todo aquele tempo, aquela contagem sem fim de meses, anos; aquele tempo todo, passado, a conta perdida, lá estavam eles, novamente. Frente a frente, o grande salão separando-os pela distância de um punhado de passos. 

Entre eles, pessoas dançando, bebendo, jogando conversa fora, todos aguardando pelo minuto final, quando dezembro viraria janeiro e um novo ano se descortinaria diante dos seus olhos, feito mágica. A poesia do recomeço. A metáfora perfeita.

Olhavam-se, mas sem nenhum dos dois dar um passo. Orgulhosos, nenhum desejava demonstrar o sentimento da perda, que parecia brotar no elo entre os seus olhos. Aquele tempo, tanto tempo, perdido. Sorriam, discretamente; evitavam-se para então buscarem um ao outro. 

Cruzavam-se, fingindo não se verem, como se brincassem um jogo só deles, aquela energia voltando gradualmente, eletrizante, trazendo consigo os arrepios, as borboletas de abdômen, a adrenalina. Como se ainda fossem aqueles, de antes. 

De ontem.

Disfarçavam entretenimento na companhia de outras pessoas, numa taça de vinho, na contagem dos ponteiros do relógio. Ela caminhou até a ampla sacada, para ver as luzes da cidade, ele fingia interesse numa história que escutava. Ela então apoiou as suas costas na balaustrada, lançando um olhar de intimação. E ele respondeu com um aceno discreto.

A combinação de números no seu relógio dizia que menos de 3 minutos separavam o ano velho do ano novo. Ele sorriu, escondendo um suspiro. Surrupiou duas taças e uma garrafa de espumante, que parecia congelar os seus dedos. 

E seguiu até o encontro dela, como se saboreasse cada passo, como se caminhasse de olhos vendados por uma avenida movimentada. Como se houvesse um laço nos olhos dela, que o traziam prisioneiro. Sorria. Sorriam. Aquela troca de segredos sem verbo, eles que sabiam exatamente do que falavam.

E lá estava ela, exuberante, os cabelos longos cascateando sobre os seus ombros descobertos; aqueles ombros sardentos, aquelas constelações anônimas que ele havia batizado com beijos. Os olhos eloquentes, penetrantes, como os de uma princesa caçadora. A cintura envelopada num vestido elegante, de onde um decote discreto e provocante mexia com a honestidade de todos os homens naquela festa.

Na falta de definições mais elaboradas, a mais bela mulher na face da terra.

Lá estava aquele sol incandescente, o seu sol particular, e era como se ele sentisse derreter a sua pele de satélite. Sua pele indefesa, sua alma cativa, suas pernas, e braços, e olhos que novamente agiam por vontade própria, capturados pelo magnetismo. Aquela mulher imantada, seu amor infantil. 

Cumprimentaram-se, republicanamente. Para então cederem ao cumprimento verdadeiro, o que realmente queriam. Ele escorregou as mãos por sua cintura, apoiando o seu rosto no seu ombro, os olhos fechados, enuviados por aquele cheiro castanho, de coisa antiga, respirando em seu pescoço algumas palavras sem necessidade de conexão frasal.

Suspiravam, as mãos afagando com saudade.

Ela enroscou as pontas dos dedos por entre os fios cada vez mais prateados, que narravam cansados a história do que um dia também foi um cabelo escuro. E então segurou o seu rosto com as duas mãos, beijando a sua boca sem aviso, como se quisesse assegurar que ele não iria a lugar nenhum.

Sorriam, juntos, bocas que eram beijo e palavra sem asa.

As luzes começavam a ganhar as esquinas que os cercavam. Fogos de artifício e todo o tipo de grito e celebração. Primeiramente de forma contida, espaçada, para então a cidade inteira ser engolida numa chuva contagiante de virada de ano. Tudo novo, de novo.

Uma nova história começava a ser escrita ali, ela sussurrou no seu ombro, na carona embriagante daquele reveillon. Aninhou-se em seus braços, os olhos fechados, protegendo-se na noite.

Ficaram ali, por horas, trocando todo o tipo de confissão, relatando uma história pretérita, entrecortando palavras e bebida, perdendo a noção da noite que pouco a pouco começava a virar dia. 

O mar quebrava na praia, não longe dali. O som inconfundível das ondas batendo na areia.

"Feliz ano novo", ela disse, aquele sorriso ébrio, os olhos brilhando, o corpo comunicando entrega.

Ela só não sabia que ele não viveria nem mais um mês depois dali.

Mas de que valia esta história? De que valeria esta verdade, naquele dia que amanhecia salino e com sabor de lembrança? De que valia perder os dedos enrolados, como cadeados? O gosto do batom que se misturava à bebida, a pele arrepiada ao vento, o cabelo que vendava os seus sonhos, o corpo dela encostado no seu, enquanto o sol rasgava o horizonte. Procurando-se, afoitos, sedentos, saudades.

"Feliz ano novo".