terça-feira, 10 de novembro de 2015

SINCERA UMIDADE


As horas desapareciam rápido, escorrendo por entre os dedos, na cadência da passagem do dia para noite, para a madrugada, para a manhã mais uma vez. Ele sabia que teria que ir embora, mas queria levá-la com ele; fugir, para algum lugar. Qualquer lugar. Reinventar a vida. Mas ele sabia que isso não seria possível.

Abraçados, dentro da banheira de água morna, eles trocavam devaneios, promessas sem fundamento, ideias. Os cabelos molhados, cascateando sobre os ombros, pescoço, seios; mãos enlaçadas, beijos molhados, olhos fechados, corpos se procurando sob a água, querendo voltar ao encaixe.

Deitaram na cama, sem roupa, sob lençóis que narravam uma história de pele, suor e saliva. Voltaram a ser um só, mais uma vez; uma última vez. Decidiram ser irresponsáveis, plenos, queriam estar dentro um do outro, até o fim, misturados, unidos; ela sussurou que queria assim, que ele continuasse ali, dentro do seu corpo, mesmo quando já não estivesse mais ao seu lado.

Beijaram-se, amaram-se de olhos fechados, entregues ao movimento de quadris e de mãos que se exploravam incansavelmente. Adormeceram por um punhado de horas, até o telefone tocar.

"O táxi já está aqui".

Ele vestiu a camisa amassada, resgatada do chão, tomada pelo cheiro dela. Vestiu-se rápido e com cuidado, para não despertá-la. Parou no meio do quarto, por alguns instantes, para observá-la mais uma vez. Despediu-se, como quem faz uma prece em silêncio, pôs a mochila nos ombros e caminhou até a porta.

"Você já está indo?", ela falou de dentro do quarto.
"Sim", ele respondeu, um sorriso triste, de canto de boca. O corpo querendo ficar.

Ela se levantou, o lençol preguiçosamente cobrindo a sua linda nudez. Caminhou a passos lentos até o seu encontro, abraços, beijos, carinhos, olhos úmidos. O lençol escorrendo pelo seu corpo até o chão, como um vestido de noiva. Despediram-se na soleira da porta e ele desapareceu, na penumbra do corredor do hotel.

A janela do táxi era pintada por tons lilases e azulados, prenúncio da manhã, enquanto ele atravessava a cidade, em silêncio, rumo ao aeroporto. A testa encostada no vidro, olhos fechados, suspiros, e um vazio que transbordava no seu peito, sem fundo, sem fim. Ele havia se preparado para isso; mas respirou fundo, bilhete em mãos, sala de embarque, voo confirmado.

Perdeu-se no sono dos condenados inocentes, enquanto o sol amarelava os seus sonhos, por trás da pequena janela da aeronave. Olhou para a cadeira vazia, ao seu lado; procurou-a sem sucesso. Ainda sentia o seu cheiro, o seu gosto; a sincera umidade, escorrendo pelo seu rosto enquanto ele rabiscava numa folha de papel.

Para não esquecer... para que seja real.

Uma história que começava e terminava entre as nuvens, sob as asas corajosas de um avião. Ele brincava com os seus pensamentos, quase infantis, narrando finais inventados, felizes, para aquele desencontro; como nos filmes. Sussurrava o nome dela, saboreando as letras, enrolando-as na língua, como poesia. Aquele amor de espera, inesperado, breve, devastador. Como são as melhores histórias de amor.

Você não foi a primeira a me amar, já diz a canção.
E eu não serei o último a amar você.

Encontros assim deveriam ter um final. Algum final. Mas nem sempre é assim, a vida tem dessas coisas; o fato é que eles não se veriam nunca mais, guardando consigo as lembranças, que amarelam na passagem do tempo, de uma história que nunca foi.

Nenhum comentário: